Dois pintores cubanos residentes na França exibem sua obra no Centro Cultural Casa de Victor Hugo, na Cidade de Havana até o dia 15 de fevereiro.
Fui à inauguração da mostra “Cimarrones em Montmartre”, dos pintores Francisco Rivero e Lorenzo Padilla Assisti convidada por Mercedes Aguirre Sotolongo, curadora da exposição, aliado a uma amizade de mais de trinta anos a Francisco Rivero.
Não posso falar desta exposição como o faria uma crítica de arte ou conhecedora de pintura, porque não sou. Apenas entrei no salão do segundo andar, o primeiro que chamou minha atenção fui um quadro no fundo da sala, na parede que ficava justo em frente, e que me atraiu pelo colorido e alegria que me produziu instantaneamente.
Mesmo assim decidi ser disciplinada e seguir uma espécie de ordem sugerida pela colocação das palavras da curadora a minha esquerda, e os quadros em sucessão a partir delas.
Se o primeiro quadro me atraiu pela profusão de cores, agora me surpreendia a variedade de técnicas e suportes empregados por Francisco Rivero: colagem, tinta sobre cartolina e óleos sobre o mesmo suporte; também se incluíam várias colagens com acrílico sobre papelão, um material que aqui empregamos para cobrir buracos em uma porta ou janela de forma provisória, em nossas casas.
De alguma maneira estes trabalhos me fizeram pensar em uma busca das raízes africanas, uma nostalgia de emigrante, tristeza da distância e a busca de si mesmo, talvez pelos tons sombrios, o emprego do preto como única cor em alguns casos. Me vem à mente uma frase que dá título a um de seus quadros: “Alguns são folhas, outros são ramos, porém eu, eu, eu, eu...sou a raiz”.
Finalmente cheguei ao quadro que me havia chamado a atenção e então veio a surpresa porque não era um óleo.
Algo que pude notar nas peças de Francisco Rivero foi que em nenhum dos casos usou o óleo como suporte. Neste caso, também não se tratava de cartolina, mas sim de uma combinação de fragmentos de tecidos costurados.
Este quadro se intitula: “Um dia sem nuvens”, algo que para nós é só um dia típico, porém este título me sugere que na França um dia assim pode ser algo especial e talvez muito esperado.
O uso de tecidos se repete nos três quadros restantes que fazem parte da mostra de Francisco Rivero. Se tivesse que descrevê-lo apenas a partir de suas peças, diria que possui uma mente inquieta e uma necessidade de explorar e experimentar constantemente.
Porém também tive a oportunidade de conversar com ele, e fiquei sabendo de seu interesse pelo tecido como elemento da vida cotidiana, que tem como função principal a de nos vestir.
Não me espantou saber, posteriormente, que este homem que estudou pintura na Academia de San Alejandro em Havana entre os anos 1972 e 1976 também se formou no Instituto Superior de Desenho no ano de 1984.
Na obra “A grande felicidade toma seu espaço”, o papel de cobrir parede se soma à combinação de tecidos, assim como em “Chega no silêncio eloquente de um sonho”, onde emerge a silhueta de uma mulher caribenha ou africana, a partir da combinação. No quadro “Na fria colina uma canção” se combinam as cores azul, vermelho e branco; cores da bandeira francesa que são também, casualmente, as cores da bandeira cubana.
Ou talvez não casualmente, pois foi a Revolução francesa com seus ideais de liberdade, igualdade e fraternidade, a que inspirou quase todos os levantes revolucionários do século 19.
A realidade destes ideais na França contemporânea é uma preocupação constante que se reflete nas conversações com Francisco Rivero.
Fui descobrindo esta exposição através de várias visitas nas quais sempre um detalhe novo se revelava, e também ao falar com seu criador.
Dentro desta mostra, composta principalmente por quadros, se inclui uma pequena instalação feita em cartão que se utiliza como embrulho nas lojas e que muitas vezes vemos atirada fora dos armazéns e nos cestos de lixo.
Confesso que não me chamou a atenção até a terceira visita, fundamentalmente por seu título “Visão”.
O artista me conta que se trata de um envoltório que protegia um telefone de fibra óptica que instalaram em sua casa na França; o homem que fez o trabalho perguntou a Francisco se ele podia se desfazer do envoltório, porque aparentemente o senhor não tinha tempo, e Francisco aceitou a incumbência.
Porém logo viu as potencialidades do material para converter-se, em seu estado natural, sem ser alterado com pintura, em uma obra de arte. Essa foi a visão que teve ao contemplar o envoltório e ensaiar formar com ele. Daí o título da obra que agora está em exibição na Casa de Victor Hugo.
Nesta exposição estão também uma aquarela e três óleos sobre tela em pequeno formato, sem título, do pintor Lorenzo Padilla. Este artista obteve uma bolsa do Museu do Prado nos inícios dos anos sessenta e desde finais dessa década vive na França.
Francisco o descreve como uma pessoa de grande sensibilidade e elevados princípios. Doou obras de arte à cidade de Matanzas e também uma coleção de arte africana que está em exibição no Museu de Arte Africana de Matanzas. Por este motivo, recebeu a Distinção pela Cultura Nacional no ano de 2006.
O lugar escolhido para esta exposição também não parece ser casual. Se trata do Centro Cultural Casa de Victor Hugo, situado na rua O’Reilly de Havana Velha.
O célebre escritor francês nunca viveu neste lugar, porém este Centro foi inaugurado em 16 de abril de 2005 para render-lhe homenagem por sua solidariedade com os cubanos que lutaram pela independência contra a metrópole espanhola no século 19.
Também se diz que manteve correspondência com nosso Apóstolo José Marti. Daqui se difunde a cultura francesa na comunidade, com aulas de línguas, conferências e mostras de filmes.
Neste local permanecerá aberta a exposição “Cimarrones em Montmartre” até 15 de fevereiro.
HAVANA TIMES, 7 février.
Yusimi Rodriguez, photos: Alejandro Morales